Skip links

10 Considerações sobre A vida de Philip K Dick, de Anthony Peake ou sobre o homem que lembrava o futuro

Fonte http://www.listasliterarias.com/2020/06/10-consideracoes-sobre-vida-de-philip-k.html

O Blog Listas Literárias leu A vida de Philip K. Dick – O homem que sonhava o futuro, de Anthony Peake publicado pela editora Seoman; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:
1 – Dividido em três partes, a primeira com sua biografia e as outras duas com possíveis explicações aos estranhos fenômenos vivenciados por Philip K. Dick, esta obra de Anthony Peake de certo modo faz jus ao histórico de PKD mantendo a aura mitômana  que envolve o autor e sua criação, partindo daí, quem sabe, as virtudes e as possíveis contradições deste trabalho que acima de tudo é uma relevante reunião sobre os eventos na vida de Phil, exposto em sua humanidade, o que significa dizer em sua luz e sombras que moldam o humano;
2 – Assim, como diz Lúcio Manfredi na abertura desta edição “Anthony Peake tem sua própria teoria, explícita no título do livro. Ele acredita que Philip K. Dick era capaz de acessar um nível mais profundo de consciência, onde o tempo como conhecemos não existe” e que de acordo com Manfredi PKD “foi capaz de antecipar o mundo contemporâneo com precisão assustadora” residindo especialmente nesta afirmação um dos elementos que tem feito a obra de PKD cada vez mais procurada por leitores, já que, como veremos, de fato suas narrativas escritas num passado parecem levar a um homem que em sua capacidade de antever o futuro o escreve como se nele estivesse presente pois ainda conforme Manfredi “ele escrevia sobre um mundo como o nosso, onde nada é o que parece ser, em que é quase impossível distinguir o real do simulacro, notícias verdadeiras de factóides da mídia, tudo mergulhado numa atmosfera onipresente de irrealidade”;
3 – Do mesmo modo, o livro de Peake reforça em certo nível o que Paulo Bressane diz “PKD era doidão mesmo. De dar medo” pois em algum ponto o autor por meio do duplo assume seus personagens, ou seus personagens acabam sugando o autor, processos que serão abordados por esta biografia. Todavia é Bressane que faz o alerta sobre o autor da biografia apontando para possíveis debates, “controverso, Peake tem sido seguidamente confrontado por céticos e cientistas (ele não tem formação em ciências; estudou história, sociologia e depois se formou na London School of Economics) por suas teses aproximando paranormalidade, xamanismo, física quântica, espiritualismo e gnose, comprovadas por experimentos empíricos e métodos polêmicos. Neste sentido, PKD parece o personagem ideal para confirmar suas hipóteses”;
4 –  E Anthony Peake é provocativo em suas teorias de fato. No prefácio como se anunciasse um messias, e veja bem o quanto isto está na obra de PKD, ele diz “é fato que o tempo de PKD chegou”. De acordo com Peake “o livro explora a ideia de que todos os seres humanos têm dois centros de cosnciência: o Eidolon, a parte cotidiana que vivencia o tempo de forma linear e não conhece nada além da soma total de suas experiências, e o Daemon, a parte que existe num ponto atemporal em algum lugar das terras fronteiriças entre a vida e a morte” indo ao ponto de nos provocar “o leitor pode interpretar isso como quiser. Eu considero essas situações como pano de fundo interessante para este livro” referindo-se aos possíveis eventos sobrenaturais ou não explicados na vida de Phil que de acordo com Peake “elas me ajudaram a estruturá-lo [o livro] de forma a focar nos aspectos precognitivos da vida de PKD”;
5 – E aqui já podemos partir para analisar a obra a partir daquilo que nos importa mais, a abordagem da vida de PKD. Nesse sentido menos as insinuações esotéricas propostas; talvez o que mais possa perturbar ou incomodar o leitor é certa mensagem subjacente da construção de certa relação de causa e efeito entre a vida amorosa conturbada de PKD e sua literatura. Não que se ignore a possibilidade de em algum grau tudo isso reverberar nas obras, assim o é de modo geral com os autores, é na vida que encontram a matéria prima de suas literaturas, contudo, esta não vive apenas da transmutação de personagens como às vezes parece propor Peake. O que fica ainda mais forte ao estruturar os capítulos de sua biografia com divisões pelos cinco casamentos do autor e com isso acabar estabelecendo fases em sua escrita de acordo com seus divórcios e paixões;
6 – Tal escolha por vezes escamoteia aquilo que talvez seja a proposta mais assertiva do próprio Anthony Peake, quando observa a mente em turbilhão de sensações, incômodos e percepções em um autor capaz de apontar para as estranhezas do mundo. Do mesmo modo a ligação mais imediata aos relacionamentos encobre algo que também está no texto, a erudição de PKD, que acompanhava com interesse publicações científicas em questões que são caras à sua literatura, memória, mente e cognição. Talvez a confissão de alguém que procura compreender as armadilhas de seu próprio cérebro e nessa busca encontra a literatura e a escrita como forma de organizar suas angústias e dúvidas;
7 – Nesse sentido é que este leitor em particular acaba tendendo mais à terceira parte do livro a que Peake esboça “uma explicação neurológica” aos fenômenos e eventos que acabam de algum modo sendo trabalhados e ressignificados na literatura de PKD. Me parecem as mais racionais, mas pelo perfil do próprio biógrafo, Peake parece não querer este caminho, “as experiências de PKD podem ser explicadas por meio da aplicação de anomalias neurológicas conhecidas, mas levar algo em consideração não é o mesmo que explicar”;
8 – Ou seja, Peake está predisposto ao esotérico; o que não significa que tal visão tenha menos força que as explicações neurológicas. A própria argumentação do biógrafo procura dar consistência às relações entre os fenômenos experimentados por Phil e sua adesão a uma filosofia gnóstica é bastante ampla, especialmente no que diz respeito às noções, teorias e possibilidade de tempo presentes na obra de PKD. Aliás, nesse aspecto há um Peake em estado puro retomando estudos científicos que poderiam ter influenciado Dick tal como estes ajuntados com diferentes filosofias e influências moldam PKD, o que acaba dando sua “explicação esotérica”;
9 – Todavia, PKD como lembra Peake “era um indivíduo compleXo, com a tendência a dar versões muito divergentes dos acontecimentos (e das ideias) dependendo de quem fosse seu interlocutor. Infelizmente isso significa que é muito difícil isolar exatamente aquilo em que ele acreditava”. A bem da verdade, a este leitor reforça a visão de alguém ubíquo justamente por sua construção metamorfa que consciente ou não parece ter vindo para instigar, provocar e por todas as certezas sob dúvida. Nesse sentido PKD é altamente exitoso já que sua paranoia hoje é partilhada por muitos;
10 – Enfim, A vida de Philip K. Dick – O homem que lembrava o futuro entre ciência e esoterismos e filosofias e experiências humanas joga ainda mais mistérios e interesses sobre este autor que certamente está no panteão da literatura em seu século XX. Ao antecipar o século XXI e seus supostos talentos cognitivos aqui nos chegam junto do homem em suas virtudes e defeitos, um homem complexo e contraditório como sua obra, pois a despeito se seu difícil trato social, seu convívio amoroso conturbado convive com o homem que sempre encontrou bons amigos pelo caminho, um personagem de si mesmo, o si mesmo que se faz um personagem, PKD segue misterioso e fascinante nesta biografia de Peake;

Leave a comment

Este site utiliza cookies para incrementar sua experiência.
Explorar
Puxar