Fonte https://www.huffpostbrasil.com/entry/orfaos-da-terra_br_5d8e6c04e4b0019647a88ca7
Já vimos essa novela antes. Órfãos da Terra — produção das seis encerrada nesta sexta-feira (27) — repetiu uma característica que tornou-se recorrente entre algumas das últimas novelas da Globo: tramas que não se sustentam ao longo dos meses. Foi assim também com Verão 90, Segundo Sol e O Tempo Não Para.
Suas histórias esgotaram-se antes da metade, sobrando embromação para segurar seis meses no ar. As tramas iniciaram em grande estilo, com todo o gás, cativando o público, para logo perderem a força. Algumas mantendo a audiência, outras não conseguindo segurar.
A primeira fase de Órfãos da Terra, estrelada pelo vilão Sheik Aziz, recebeu merecidamente todos os aplausos. Com um roteiro de tirar o fôlego e grandes interpretações — principalmente de Herson Capri, Letícia Sabatella e Ana Cecília Costa —, a direção (artística de Gustavo Fernández) exibiu um espetáculo que o público estava habituado a ver apenas no cinema, em séries documentais ou no horário das 23h da Globo.
A morte (prematura) do sheik, no entanto, mudou tudo. A novela perdeu a força e o brilho iniciais. O roteiro se esvaiu em uma vingança sem sentido e cansativa — e a direção afrouxou.
Nem foi a primeira novela de Thelma Guedes e Duca Rachid a sofrer desse mal. Praticamente todas as suas tramas são repletas de idas e vindas que não saem do lugar, nas quais o vilão persegue o mocinho. Órfãos da Terra foi outro show de gato e rato, entre uma bruxa de desenho animado e um casal de mocinhos chatos, com direito a tramas batidas que subestimam o público em entrechos dignos de “plano infalível do Cebolinha”. A ótima Alice Wegmann bem que se esforçou, mas não conseguiu escapar das caras e bocas de sua personagem, a vilã Dalila, diante de um roteiro banal e repetitivo.
O melhor de Órfãos da Terra — e o que valeu a pena a audiência — estava fora da trama principal de vingança. Primeiro, a abordagem cuidadosa aos refugiados, suas dificuldades de socialização e inclusão tratadas por meio de personagens fictícios e em depoimentos de refugiados reais. Os depoimentos eram tão bons que lamenta-se não ter havido mais. Já na fase final, surge outro tema social, o Alzheimer, sensivelmente conduzido pelas autoras e pelos atores Flávio Migliaccio e Osmar Prado, cujos personagens estavam, até então, em um contexto cômico. Um show dos atores veteranos!
Se em Órfãos da Terra os dramas calcados na realidade (refugiados e Alzheimer) sobressaíram em detrimento do folhetim desvairado da trama central, o alívio cômico permitiu o contrabalanço ideal. As confusões de um quarteto romântico disfuncional, que, a princípio, antagonizava árabes e judeus, fizeram brilhar, além de Migliaccio e Prado, Nicette Bruno, Marcelo Médici, Verônica Debom, Luana Martau e Mohamed Harfouch.
Os conflitos entre judeus e árabes foram tratados com leveza e respeito, sem subestimar o público ou reforçar estereótipos que depreciam questões políticas e culturais desses povos.
As qualidades de Órfãos da Terra garantiram a audiência: média final de quase 22 pontos no Ibope da Grande SP. A novela de Thelma Guedes e Duca Rachid levantou o moral do horário das seis aproveitando o bom momento do final de tarde da Globo e entregando bem para as atrações seguintes (também em ótima fase). Seu resultado no Ibope é ainda uma boa herança para a nova novela, Éramos Seis, que começa na próxima segunda-feira (30).
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