Para evitar a disseminação do coronavírus nas escolas, a Prefeitura do Recife suspendeu, ainda na semana passada, as aulas da rede municipal de ensino. Dessa forma, uma das preocupações levantadas pelas famílias dos 90 mil estudantes da rede era a alimentação das crianças nesse período, considerando que parte delas vive em situação de vulnerabilidade social e fazia de uma a três refeições na escola.
Na tentativa de garantir a alimentação das crianças em casa nas próximas semanas, a Prefeitura do Recife iniciou na última quarta (18) a distribuição de kits para alimentação dos estudantes de anos finais e Educação de Jovens e Adultos (EJA) da rede municipal. Em nota, a prefeitura afirmou que cerca de 270 toneladas de alimentos serão distribuídos, além de material pedagógico e kit de limpeza. Apesar da iniciativa, familiares que receberam os kits na semana passada postaram vídeos e fotos nas redes sociais mostrando indignação com a qualidade e a variedade dos alimentos.
“Dois biscoitinhos, uma paçoca, duas laranjas, uma goiaba, uma maçã, uma barra de goiabinha e uma pacote de leite. Esse é o alimento de cinco dias de uma criança na escola?” Questiona Daniele Lins, trabalhadora informal e mãe de quatro crianças, sendo que duas delas estudam na rede municipal. Com o incentivo à reclusão para evitar a infectação pelo coronavírus, Daniele tem ficado em casa com as crianças e impossibilitada de trabalhar vendendo água e salgados nos semáforos “O movimento nas ruas parou por causa desse vírus. Como a pessoa vai vender se não tem gente na rua e os que têm não querem abrir os vidros do carro? Passo o dia inteiro em casa e as crianças querem almoçar, tomar lanche e com esse kit não dá”, afirma. A única fonte de renda da família além do trabalho de Daniele é o Bolsa Família, no valor de R$ 157,00, que ela afirma ser insuficiente para sustentar a casa nos próximos meses.
Com a repercussão do desabafo de várias famílias nas redes, a Prefeitura do Recife informou em nota que o kit distribuído na última quarta “corresponde aos lanches que os estudantes fariam nas escolas na quarta, quinta, sexta e segunda-feira. Os kits variam de acordo com o número de refeições que são feitas na unidade de ensino e foram elaborados por nutricionistas. Já para os alunos de creches e de escolas integrais, além dessas refeições, a Prefeitura do Recife disponibilizou uma pequena cesta básica para os pais que podem preparar a merenda quente”.
Já a Secretaria de Educação do Estado, durante o anúncio de suspensão das aulas na segunda (16), informou que também distribuiria kits para os 580 mil alunos da rede a partir da última quarta (18), mas que ainda estava pensando na logística de distribuição por causa da grande quantidade de alimentos a serem organizados e enviados para os municípios. Daniele também lamentou a ausência dos kits alimentação do Governo do Estado “Os mais velhos estudam na rede estadual, estou esperando até agora uma solução. Como eles estudam em período integral, disseram que iam ver o que fazer, mas acabou a semana e ficamos sem saber de nada”.
Com as denúncias circulando pela internet, a Câmara de Vereadores do Recife vem se movimentando para fiscalizar os próximos kits distribuídos pela rede municipal “A Câmara não tem poder para solucionar esse problema, essa questão é com a prefeitura, mas a Câmara pode pressionar. A gente buscou uma elucidação da prefeitura e justificaram que esse kit menor era para o turno regular. O que recebemos de resposta é que o conteúdo dos kits está sendo rediscutido lá, mas essa é uma demanda do Poder Executivo. Nós vamos fiscalizar esses novos kits distribuídos pelas escolas e esperamos que tenha melhorado” projeta o vereador Ivan Moraes (PSOL), que vem recebendo denúncias de várias famílias em relação aos alimentos.
A perspectiva de melhoria nos lanches, que serão distribuídos na sexta (27) é aguardada por Daniele, que se preocupa em como alimentar as crianças e garantir sua saúde pelas próximas semanas “Eles estão falando tanto dessa epidemia, mas deveriam mandar mais frutas e comida saudável, porque as frutas que vieram são muito pequenas, algumas já vieram estragadas. Devia vir uma feira mesmo, com arroz, feijão, charque, como vem a cesta básica da rede integral. Quem tem condições de dar uma merenda boa pro seu filho todo dia em casa? Isso que veio não é saudável para nossas crianças”, conclui.